A greve dos servidores da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte
(Uern) ganha força na seara judicial. O Tribunal de Justiça do Rio
Grande do Norte decidiu que a paralisação é legal, contrariando pedido
do Governo do Estado que solicitou a ilegalidade do movimento. A decisão
é da juíza convocada Sulamita Pacheco, em substituição ao desembargador
Amaury Moura Sobrinho, e foi proferida anteontem, já que não houve
acordo em audiência de conciliação promovida no mesmo dia pelo TJRN
entre servidores e Governo do Estado.
"A greve que hora se analisa
não possui ilegalidade que se possa enxergar neste momento processual,
exatamente por ser uma reação às condições de trabalho e o exercício do
direito de autodefesa de categorias. Assegurar agora o direito à greve
traz como consequência a segurança de uma educação mais digna",
justificou.
Para a magistrada, o Estado não cuidou de maneira
satisfatória de demonstrar a existência de requisitos necessários,
perante a lei, para alcançar a concessão da ilegalidade. Além disso,
está claro descumprimento pelo Estado do acordo assinado em setembro de
2011, de reajustar o salário do servidor em 10,65% em abril deste ano, o
que não ocorreu.
O acordo, amplamente divulgado na mídia na época,
inclusive no site oficial do Governo do Estado, foi a condição para o
fim aos 106 dias de greve no ano passado, a maior da história do serviço
público do Rio Grande do Norte. Para encerrar o movimento, o
funcionalismo aceitou parcelar o reajuste em três anos. E foi o
não-pagamento da primeira parcela, este ano, que motivou a nova greve,
iniciada no último dia 3.
Segundo Sulamita Pacheco, é notório no
Brasil que a classe dos professores vem sofrendo péssimas condições de
trabalho e uma remuneração que não condiz com a importância do ensino.
"Por isso mesmo, há de se reconhecer a necessidade de fortalecimento da
categoria desses profissionais, base da sociedade, bem como os direitos
dos docentes de reivindicar melhores condições de trabalho mais justos",
disse.
A desembargadora convocada ressaltou ainda que não visualiza
desrespeito ao direito constitucional, apesar da alegação do Estado de
violação ao artigo 205 da Constituição Federal. "Ao contrário, ao passo
que se busca respeitar o direito dos professores a uma luta por melhores
condições de trabalho, o resultado é o fortalecimento da educação",
argumentou.
Para embasar juridicamente a decisão, a magistrada
lembrou que o ministro Joaquim Barbosa, do Supremo Tribunal Federal
(STJ), ao julgar tema semelhante, vaticinou ser o movimento grevista um
instrumento legítimo e que o caráter essencial ao serviço não sugere
vedação ao exercício do direito de greve.
"Posto que a essencialidade
dos serviços paralisados indica, na realidade, um chamado à razão e à
responsabilidade de todos os atores envolvidos, cabendo ao Judiciário
zelar pelo exercício do direito à greve e não mitigá-lo. "Não vejo como o
Poder Judiciário calar neste momento, este grito, que busca a
efetivação de um Estado democrático livre, igualitário e justo",
escreveu a juíza Sulamita Pacheco.
O presidente da Associação dos
Docentes da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte (Aduern),
professor Flaubert Torquato, avaliou que a decisão da desembargadora
convocada revela o discernimento dela que a greve é justa, porque o
governo descumpriu o acordo firmado com as categorias.
SEM DINHEIROSegundo a Aduern, anteontem à noite,
após depositar os salários dos servidores na conta da Universidade, o
Governo do Estado mandou suspender o pagamento apostando na decretação
da ilegalidade da greve.
Em audiência com a desembargadora convocada
Sulamita Pacheco, ontem pela manhã, a diretoria da Aduern foi informada
que o Governo do Estado já foi intimado da decisão do Judiciário
estadual sobre a legalidade da greve. "Agora, a Aduern aguarda o
cumprimento da decisão judicial por parte do governo. Caso a
administração descumpra, a desembargadora irá tomar as medidas
cabíveis", afirma Flaubert Torquato.
Ontem à noite, a Administração
Superior da Uern informou que o pagamento a docentes,
técnicos-administrativos e aposentados, retido pelo Governo do Estado,
deve ser liberado hoje, conforme foram informados ontem pela equipe
econômica do governo o reitor Milton Marques de Medeiros e o pró-reitor
de Planejamento, Severino Neto.
Estado anuncia que vai recorrer da decisão
O Governo do Estado recorrerá da decisão do Tribunal de Justiça do
Rio Grande do Norte sobre a legalidade da greve na Uern. Segundo o
consultor-geral do Estado, José Marcelo Ferreira Costa, a decisão
divulgada liminarmente será analisada pelo governo, já que, apesar da
greve ser considerada legal, existem algumas implicações que devem ser
avaliadas, como o fato de garantir um percentual mínimo das atividades
para a população, por exemplo.
O Processo nº 2012.007272-3 - que
requer a suspensão imediata da greve e retorno ao trabalho de todos os
servidores e professores da Uern - foi ajuizada na última sexta-feira
(25) pelo Governo do Estado.
Marcelo Costa acrescenta que o Governo
do Estado, por meio da governadora Rosalba Ciarlini, buscou o diálogo e
procurou a negociação para encaminhar o Projeto de Lei à Assembleia
Legislativa, condicionado à observância do limite prudencial previsto na
Lei de Responsabilidade Fiscal.
Mas, segundo ele, as propostas foram
rejeitadas, já que os professores e servidores somente aceitam o
pagamento retroativo ao mês de abril de 2012. "Assim, coube ao Estado
judicializar o assunto para tentar garantir que os alunos da Uern não
sejam penalizados com a paralisação", justifica o consultor.
Ele diz
que o Estado do Rio Grande do Norte se encontra acima do limite
prudencial instituído pela Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), o que
impossibilita a concessão dos aumentos aos servidores no momento.